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27.12.12

{Crônica} Veríssimo Nele!




Veríssimo nele!

O sol começa lentamente a se infiltrar pela janela de meu quarto e a enfrentar a resistência que a persiana vermelha faz contra esta ação monótona e bela da natureza. Meus olhos relutam em seguir a recomendação natural de se abrirem ao primeiro raio de sol. Afinal, não sou um galo que acorda ao primeiro sinal da estrela brilhante no horizonte. Digo a mim mesmo que irei dormir mais cinco minutinhos. Afinal, hoje é sábado e não tenho compromissos pela manhã que me impedem desta regalia. Quando estou quase deitando novamente nos braços de Morfeu e me entregando ao sono profundo ouço um barulho.
TRIM.
É algum de meus talheres de metal caindo no chão de linóleo da cozinha adjacente ao meu minúsculo quarto. Estranho, pois não há mais ninguém morando em minha casa. Os amigos que estava abrigando já se foram faz três dias.
TUM.
Algo que não consigo identificar também vai ao chão enquanto penso o que está acontecendo. Resolvo me levantar e pego um livro de Veríssimo que está no criado mudo ao lado de minha cama. Caminho calmamente à cozinha e não vejo nada de longe. Nada. Mas percebo que me esqueci de colocar os óculos. Tarde demais. Não irei voltar ao quarto, pois isto pode ser fatal à minha pessoa. Apesar de estar segurando como arma um livro e estar vestido com uma regata branca e uma cueca samba-canção com desenhos, estou preparado paro tudo que vier. Seja um animal, um assaltante ou seja o que for.
CRASH.
Sinto uma dor em meu coração ao ouvir algo de vidro se espatifar no chão. Tenho um sentimentalismo e um protecionismo com minhas coisas e ouvir algo sendo quebrado sem saber o que é, é muito triste. Resolvo não esperar mais e salto no vão da cozinha e grito: “Perdeu meu bem!”. Mas não vejo nada. Não é um assaltante afinal. Minha visão, extremamente embaçada, não permite identificar que ser está fazendo da minha cozinha um parque de diversões. Ajoelho-me no chão e vejo uma colher e um copo de plástico caídos intactos no chão azul. Doe-me o coração ao ver uma taça de cristal partida em centenas de pedaços. Para mim, era como se um ente querido tivesse partido.
Enquanto estou ao chão, velando a taça, algo duro cai e minha cabeça e me faz ver estrelas. Uma frigideira de aço inox foi derrubada da prateleira de cima, onde ponho minhas lustrosas panelas. Ele está lá. O inimigo que ceifou a vida da indefesa taça de vinho.  Pego o banquinho que está paralelo à bancada e coloco na direção da prateleira. Subo nele e analiso a cena. É um rato. Um maldito rato dançando e se divertindo em meio de frigideiras, panelas de pressão e de barro. Preciso fazer algo. Levanto meu Veríssimo e taco no rato. Ele não morre, mas sai correndo, cai da prateleira e foge para fora de minha casa em direção à casa de Dona Dirce. Sinto-me satisfeito e respiro aliviado. Agora ele vai encher a vida de outra pessoa. Sinto-me mais feliz ao saber que  é a vida de Dona Dirce, que me perturba tanto. Olho para o livro que joguei no rato. Sorrio. Luís Fernando Veríssimo nele. Não é só o peso do livro que o espantou, mas com certeza a força das palavras. Pego o livro de volta e deito em minha cama. Tenho sonhos com ratos fugindo de Veríssimos e de taças sendo quebradas. Acordo de novo. A taça. Ele quebrou um de meus cristais preferidos. Reflito e chego à conclusão de que não tem problema, pois ouço Dona Dirce chamar seu Antenor para espantar o rato. Rio. Ouço outro barulho. De novo na minha cozinha. Ponho meus óculos e corro para lá com Veríssimo na mão. Outro rato. Menor, provavelmente o filho daquela lá, mas que anda com a mesma rapidez. Quebra duas taças de uma vez. Volto para minha cama. Deito. Chega. Hoje é sábado e não tenho compromissos.  Durmo ao som da sinfonia de coisas caindo no chão. O rato pode estar se perguntando neste momento, porque ele não fez nada comigo? Lembrei de uma frase de Veríssimo: “O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos. A maneira como você encara a vida é que faz toda diferença”. Aposto que agora o rato vai embora. Pra casa da Dona Dirce.


Matheus Mans Dametto.
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